A Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins (CNTA Afins) participou nesta quarta (22/5) de audiência pública na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados. Na ocasião, a representante nacional dos trabalhadores (cerca de 500 mil) do setor frigorífico, rejeitou o Projeto de Lei 2363/11, do deputado Silvio Costa (PTB-PE), que altera o artigo 253 da CLT, limitando a concessão de pausas para recuperação térmica e ao adicional de insalubridade “exclusivamente” em frigoríficos. O documento vai contra a Súmula 438 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), editada em setembro passado, e é vista pelos trabalhadores como reação patronal à recente publicação da Norma Regulamentadora dos Frigoríficos (NR 36/ MTE), em vigor desde abril.
Em meio às divergências entre os participantes, que reuniu representantes do governo, das empresas e do terceiro setor, o coordenador político da CNTA Afins para a região Sul, Darci Pires da Rocha, comentou o alto índice de doenças ocupacionais, jornadas extensas, trabalhos penosos e alta exposição ao frio enfrentados nos frigoríficos. Segundo Darci, que representou o presidente da CNTA Afins, Artur Bueno de Camargo, definir tipos de atividades e graus de temperatura (abaixo de 4 para insalubridade e entre 10 e 15 para concessão de pausas térmicas) fere o esforço recente dos trabalhadores em torno da criação da NR 36, que levou dois anos para ser concluída.
“Nos causa surpresa esse PL que, ao nosso ver, desmancha aquilo que foi feito com um esforço comum entre empresários, trabalhadores e governo (NR 36). Ele restringe a quantidade de trabalhadores que vão ter o benefício e com isso não podemos concordar. Nos chama a atenção que essa NR faz alusão ao artigo 253 da CLT e na discussão da NR 36 não foi levantada essa discussão sobre a alteração desse artigo. Por isso, a CNTA Afins não concorda com esse projeto e pedimos a sensibilidade do deputado autor para que adeque esse PL à NR 36, que foi fruto de um esforço da sociedade e, portanto, deve ser respeitada”, defendeu.
Frio e adoecimento
A representante da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), Thaís Helena de Carvalho Barreira, questionou a fundamentação científica exigida pelo PL, que desconsidera a variação climática das regiões e a exposição dos trabalhadores à humidade nos frigoríficos. “As questões de LER/DORT, ou seja, problemas, desordem e adoecimento do sistema músculo-esquelético é, de fato, preponderante nessa categoria, e está, sim, ligada à repetitividade dos movimentos, mas existe um trabalho internacional que demonstra claramente que quando se agrega à situação de frio, colocada nesse PL como 10 a 15 graus – e não precisa ser menor que isso, essa condição de risco aumenta quase dez vezes a possibilidade de adoecimento.”, alertou.
Capital X Trabalho
Representante o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a auditora fiscal do trabalho Eva Patrícia Gonçalo Pires, afirmou que além de interferir na NR 36, a nova redação propõe “alterações maléficas e sem justificativa para o trabalhador”.
“Independente de o trabalhador exercer uma função ou outra, o risco é o frio. Outra questão está no parágrafo 3º que dá a possibilidade de que, caso a pausa não seja concedida ao trabalhador, que ela seja contabilizada como hora extraordinária. Há uma incompatibilidade entre a motivação do pagamento de hora extraordinária e concessão de pausas, que pelo artigo 253 da CLT motiva justamente a recomposição corporal e restabelecimento das funções de saúde do trabalhador. A pausa não tem o objetivo de remunerar o trabalho ou dar descanso sem motivo, e sim recuperar o equilíbrio corporal do trabalhador por conta da grave condição de trabalho a qual estão expostos.”, criticou.
Análise jurídica
De acordo com a advogada, Rita de Cássia Vivas, assessora jurídica da CNTA Afins, o artigo 253 da CLT tem como objetivo proteger a saúde do trabalhador diante dos efeitos nocivos do trabalho em ambientes frios. Segundo ela, a saúde é afetada tanto no desempenho de atividades alternadas do ambiente frio para o quente ou no caso do ambiente exclusivamente frio, independentemente se o trabalho é desenvolvido em câmaras frigoríficas ou em ambientes artificialmente resfriados. Na avaliação da especialista, além de restringir essa aplicação, a inclusão da expressão “exclusivamente” na proposta pode comprometer a efetividade do artigo 7º, XXII, da Constituição Federal.
“A própria NR 29, que trata da segurança e saúde do trabalhador Portuário dispõe sobre o tempo máximo de exposição do trabalhador. Esse mesmo entendimento deve prevalecer para os trabalhadores das demais categorias, pois o princípio é uno: a proteção à saúde do trabalhador e ao ambiente de trabalho. Portanto, o art. 253 da CLT deve conter preceito consentâneo com o art. 7º, XXII da CF, de modo que mesmo que o trabalhador não desempenhe suas atividades em câmaras frigoríficas e não transite com frequência do ambiente frio para o quente ou normal, mas desde que constatado que suas atividades laborais sejam realizadas em ambientes resfriados artificialmente, devem fazer jus ao intervalo para recuperação térmica, haja vista que o fim maior é a proteção à saúde do trabalhador, tendo em vista os efeitos nocivos do frio.”
Sobre a proposta de pagamento de horas extras diante de pausas não concedidas, contidas do parágrafo 3º do texto, a advogada levanta outra inconstitucionalidade e alerta a possibilidade de multas pesadas às empresas.
“Ora, considerando que a questão é proteger a saúde do trabalhador e atento ao fato de que a própria Constituição Federal consagra no art. 7º, XXII que é direito do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho, deveria ser proibido o labor extraordinário e de igual modo, havendo descumprimento da norma deveria ensejar aplicação de multas pesadas às empresas infratoras. Oportuno considerar que a jurisprudência do TST encontra-se bastante sensível a essa peculiaridade e necessidade do trabalhador, tanto assim que em reiteradas decisões tem concedido o intervalo para recuperação térmica desde que constatado o ambiente em labor frio ou quando há percurso entre ambientes frios e quentes, ainda que não haja labor direto em câmaras frigoríficas.”, afirma.
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